segunda-feira, setembro 22, 2025
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Minas é primeiro estado a incluir detecção de Síndrome de Rett no teste do pezinho

REDAÇÃO – Desde abril deste ano, o teste do pezinho em recém-nascidos passaram a detectar, também, a Síndrome de Rett, uma doença rara que acomete principalmente meninas. A notícia foi recebida com aplausos e surpresa dos participantes da audiência pública realizada, nesta sexta-feira (19/9/25), pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

A informação foi repassada pela diretora de Políticas Estratégicas da Secretaria de Estado de Saúde, Raquel Guieiro Cruz, ao explicar que a detecção da doença foi incluída na ampliação dos diagnósticos do teste do pezinho, que agora consegue auferir 60 doenças raras. Minas passa a ser o primeiro estado do País com tal alcance.

A dificuldade de um diagnóstico foi uma das principais reclamações de mães de pessoas acometidas pela doença, durante a audiência pública. Por ser uma doença progressiva, quanto mais cedo for feito o diagnóstico maiores as chances de reduzir ou retardar os sintomas e acelerar o tratamento.

A presidenta da comissão, deputada Ana Paula Siqueira (Rede) explicou que a identificação precoce da doença salva e ajuda a atendimento melhor. Muitas crianças só têm a doença identificada após os 2 anos de idade, quando muitas vezes já apresentam limitações irreversíveis

A Síndrome de Rett é uma doença neurológica incurável causada por mutações genéticas no gene MECP2, localizado no cromossomo X. Afeta principalmente meninas, cerca de uma em cada 10 a 20 nascimentos. A ocorrência em meninos é muito mais rara, afetando um a cada um milhão de nascidos e quando ocorre costuma ser mais mortal.

A doença é progressiva e causa a perda de habilidades motoras, de fala e intelectual. Entre outros sintomas são recorrentes convulsões, escoliose e prolemas digestivos e respiratórios, este último sendo a causa de 90% dos óbitos, segundo a presidente da Associação Brasileira de Síndrome de Rett (Abre-te), Denise Antonia Marinho Trindade.

Em Minas Gerais, conforme Denise Trindade, são registrados 175 casos de pessoas com Síndrome de Rett, entre elas três meninos, um deles, Gabriel, de 19 anos, já atingiu a fase adulta. Embora a maior parte das mortes ocorram na infância ou adolescência, em Minas mora a pessoa mais idosa do País já diagnosticada, Adriana Zeferino, com 53 anos. Segundo Denise, uma mulher de 87 anos está sendo investigada como uma possível pessoa com a deficiência.

O drama de quem cuida

A Síndrome de Rett exige que o tratamento seja por toda a vida. As pessoas afetadas pela doença são totalmente dependentes e precisam de atenção 24 horas. De acordo com participantes da audiência pública, ainda há poucos especialistas na doença o que dificulta o diagnóstico preciso, especialmente por muitas vezes ser confundida com autismo.

Todas as mulheres que relataram seus dramas durante a reunião sofreram pelo diagnóstico tardio. Irmã de Adriana, Jaqueline Cardoso Zeferino é uma delas. Até os 30 anos, Adriana era tratada como pessoa com transtorno do espectro autista. Desconfiada do diagnóstico, Jaqueline passou a pesquisar mais sobre os sintomas da irmã até encontrar a associação Abre-te e receber as orientações que buscava. Apenas em 2022 foi realmente fechado o diagnóstico como a síndrome. “Toda essa dificuldade leva à subnotificação”, adverte.

O esclarecimento da doença, segundo conta, mudou o tratamento e, por consequência, a vida de Adriana. “Hoje ela é supertranquila, antes tinha sempre muitas crises de agressividade”, lembra Jaqueline. O tratamento da síndrome exige um tratamento com profissionais de diferentes áreas da saúde como neurologista, fisioterapeuta, psicólogo, fonoaudiólogo, entre outras, a depender das necessidades de cada paciente.

Os múltiplos cuidados exigem dedicação praticamente integral de quem cuida. Além de responsável legal de Adriana, Jaqueline divide os cuidados com a irmã Simone de sua mãe, que luta contra um câncer agressivo de mama e tem demência avançada. Simone abandonou o emprego e Jaqueline pediu licença e luta na justiça para ter reconhecido o direito de uma jornada reduzida.

“Nós abdicamos de nossa vida social, profissional porque muitas vezes não temos com quem contar, muitas cuidadoras não tem um dia só para cuidar de si próprias”, lamenta. Para Jaqueline é fundamental que o Estado assegure apoio financeiro, assessoria jurídica e uma rede de apoio às famílias. “Precisamos de ajuda e de suporte”, completa Denise Trindade, mãe de Dandara, que teve a doença agravada a partir dos 6 anos também após a demora no diagnóstico.

O caso que provocou mais emoção e muitas lágrimas durante a audiência pública foi o de Lana Fonseca, nascida em 2010 e diagnosticada corretamente apenas quatro anos depois, quando já começou a perder a capacidade de engolir e sofrer com broncoaspiração. Sua história foi contada pela mãe Rita de Cássia da Silva, que cuidou sozinha da filha, sem ajuda de redes de apoio. Fotógrafa, ela levava a pequena para os trabalhos, mas à medida que foi crescendo teve dificuldades no transporte e, por fim, teve de abandonar o trabalho para se dedicar totalmente à menina.

Em 2022, Rita iniciou o tratamento da filha com óleo canabidiol, com a ajuda financeira de parentes, e se animou com o rápido progresso que ela apresentou. “Em poucos dias, passou de paciente paliativo para estável”. Apesar do progresso, Lara acabou falecendo em agosto do ano passado, por pneumonia.

Sem a filha, sem a pensão dela que era a única renda, Rita, hoje, sofre não só com o luto, mas com depressão e doenças que adquiriu pelo esforço do trabalho solitário e forçado. “Hoje, estou aqui para fazer um clamor por essas crianças, pelas famílias por uma lei que acolha essas mulheres cuidadoras que passam despercebidas pela vida e sem despertar o interesse do poder público”, suplicou.

As dificuldades de Rita foram destacadas por Cláudia Viana de Andrade Batista, mãe de Cecília, que vai completar 30 anos em novembro. Ela sugere que o Estado forneça apoio financeiro e previdenciário a mães e cuidadoras que não são remuneradas e não têm nenhuma garantia de sustento. Na opinião de Cláudia o ideal é que essas mulheres tivessem direito a licenças em casos de doenças e até mesmo aposentadoria. “Com o avanço dos tratamentos, as meninas estão sobrevivendo e as mães envelhecendo”, alerta.

A deputada Ana Paula Siqueira explicou que já tramitam projetos na Assembleia que buscam implementar políticas de atenção às pessoas com doenças raras. Mãe atípica, a parlamentar considerou muito importante a capacitação de profissionais de atenção primária, a oferta de equipes multidisciplinares e o acesso a medicações e terapias contínuas aos pacientes.

“Se a necessidade é de uma vez por semana, não adianta oferecer o atendimento a cada 45 dias ou dois meses”, exemplificou. Da mesma forma, o acesso à educação inclusiva deve garantir o atendimento ao aluno com doença grave por profissionais especializados.

A interiorização do atendimento às pessoas com síndrome de Rett foi outro desafio apontado pela deputada “Falta estrutura no interior, são poucas equipes especializadas e ausência de protocolo para o diagnóstico”, criticou.

Ana Paula Siqueira ainda se comprometeu a sugerir a deputados federais a sugestão de apoio previdenciário às cuidadoras, matéria de âmbito federal. “Quem cuida precisa de suporte financeiro, de políticas que garantam renda”, defendeu.

 

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