Capoeiristas precisam de muita ginga para acessar recursos da cultura
REDAÇÃO – Reconhecida como Patrimônio Imaterial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), a capoeira ainda carrega muito da resistência que a forjou no Brasil Colônia, como resposta à violência a que os escravizados eram submetidos.
Praticamente alijados das políticas culturais, mestres e representantes de entidades voltadas a capoeiristas cobraram nesta quinta-feira (4/9/25), em audiência pública da Comissão de Cultura da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), espaço no orçamento público.
Autor do requerimento para a audiência, o deputado Luizinho (PT) defendeu a descentralização e a desburocratização dos recursos culturais, para que cheguem à capoeira. Para o parlamentar, a cultura é uma forma de garantir que as pessoas permaneçam nos pequenos municípios e a capoeira, movimento democrático que permite ocupar as ruas, é uma das expressões artísticas que podem ser fortalecidas no interior.
Além da concentração de recursos nas grandes cidades, ele criticou os editais para o incentivo de projetos culturais: rigorosos, engessados e muitas vezes inacessíveis para quem acumulou conhecimento ao longo da vida por meio da prática e da oralidade, como mestres capoeiristas.
Para contornar essas questões, Luizinho informou que está elaborando um projeto de lei para autorizar o Governo do Estado a criar um programa de custeio da cultura, nos moldes do Bolsa Família, no qual os beneficiados possam escolher em quais produções utilizá-lo.
Segundo a deputada Andréia de Jesus (PT), as manifestações dos povos e comunidades tradicionais, como a capoeira, são discriminadas em um projeto colonizador, que mantém os recursos e as políticas em benefício sempre dos mesmos grupos.
Recursos não chegam na ponta
Presidente do Conselho de Capoeira do Triângulo Mineiro e Região, Atan Sousa abordou a dificuldade de acesso dos capoeiristas a verbas já destinadas à prática. Ele denunciou que repasses oriundos da Política Nacional Aldir Blanc (Pnab) e de emendas parlamentares acabam bloqueados pelas prefeituras, que se apropriam dos recursos, prejudicando os movimentos culturais, que seriam os verdadeiros destinatários.
O preconceito contra a capoeira na administração pública também está presente em outras instâncias, como entre os profissionais da educação, frisou Atan. “Os próprios profissionais da educação repudiam nossas tradições nas escolas”, lamentou.
Capacitação auxiliaria a captação de recursos
Em resposta às contantes queixas apresentadas na audiência sobre os obstáculos para acessar recursos de leis de incentivo, o presidente do Instituto Educacional para Conscientização e Realização de Políticas Públicas, Gladstone dos Anjos, ponderou que os capoeiristas precisam se preparar para lidar com os editais.
“É necessário se capacitar para estudar onde estão os recursos, a forma de captá-los e como prestar conta disso”, argumentou, ao alertar que as verbas de fomento acabam sendo tragadas por quem estudou para pleiteá-las.

Gladstone ainda defendeu repasses “carimbados” para a cultura, como ocorreria na assistência social, para impedir sua utilização para outros fins.
Em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, a prefeitura adotou exatamente esse procedimento, relatou o secretário de Cultura, Ramon Santos, com um edital específico para a capoeira.
Expressão cultural brasileira
A capoeira mistura esporte, luta, filosofia, dança e musicalidade. A partir de golpes e movimentos corporais ágeis, a luta permitia que os escravizados se defendessem das perseguições dos capitães do mato, cuja atribuição era capturar quem havia fugido.
Com o intuito de não levantarem suspeitas junto aos senhores de escravo (que proibiam qualquer tipo de esporte), os capoeiristas adaptaram os movimentos e adicionaram elementos coreográficos e musicais, camuflando seu verdadeiro propósito.
Acredita-se que a origem do nome capoeira tenha relação com os locais onde o esporte era praticado: em campos abertos e sem vegetação. A técnica era também uma forma de preservar a cultura de origem e desenvolver laços entre os praticantes.
Fonte: ALMG